Entrevista com o professor Vinicius Castro do departamento de Engenharia Florestal da UFV

O professor Vinicius Castro concedeu uma entrevista, na qual ele aborda os conhecimentos em anatomia, preservação e tratamento da madeira. Com experiência em anatomia ele descreve o impacto e a importância do trabalho nessa área. Relata as principais técnicas e métodos de preservação da madeira e ainda deixa algumas dicas e recomendações para estudantes da área florestal que pretendem seguir carreira acadêmica e encarar o mercado de trabalho.

Confira a entrevista na íntegra:

 

1) Para começar professor Vinicius Castro, gostaria que senhor nos explicasse qual é a importância dos conhecimentos em Anatomia da madeira? Esses conhecimentos são importantes para predizer utilizações adequadas de acordo com as características da madeira?

A anatomia da madeira tem três funções primordiais: identificar espécies, predizer usos e verificar comportamentos de alterações físico-químicas. Logo, ela é sempre tratada como a primeira análise da tecnologia da madeira e a partir dela podemos definir os principais usos, seja para carvão, celulose, madeira preservada, energia e outros produtos. Os conhecimentos da anatomia da madeira influenciam tanto na usinagem, colagem, permeabilidade para o tratamento e também na produção de celulose e carvão.

2) Qual o impacto do trabalho do setor de Anatomia da madeira da UFV no Brasil?  Qual o diferencial de vocês?

A anatomia da madeira da Engenharia Florestal da UFV é uma linha de pesquisa mais básica, porém existem outros laboratórios de universidades, que são mais modernos e possuem estudos tanto na parte de caracterização como na parte de formação da madeira. No departamento de engenharia florestal da UFV o foco é a caracterização. Já outros departamentos, como por exemplo, o de Biologia, tem foco voltado para a formação da madeira. E o que é a caracterização? É a medição de fibras e vasos além da frequência e área ocupada por eles, a isso damos o nome de caracterização. E o que é formação? Na formação se tem as células meristemáticas, que estão localizadas no câmbio vascular e elas dão origem a diferentes tipos celulares, o floema e o xilema primário. Esse é o estudo da formação de madeira, ou seja, quais são as épocas favoráveis à formação e qual período possui maiores divisões celular, seja ela anticlinal ou periclinal. A anatomia se divide em duas, a formação e a caracterização, e aqui no departamento de engenharia florestal da UFV nós somos mais focados na caracterização.

3) Vocês possuem alguma parceria com outra universidade?

Nós temos parceria com o departamento de Biologia, do qual utilizamos alguns equipamentos, como exemplo o Microscópio Eletrônico de Varredura (MEV). Temos também uma parceria com a UFES, Esalq-USP, UFLA e outras instituições, onde fazemos nossas análises.

4) O que é a preservação de madeiras? A anatomia influencia na preservação?

Preservação da madeira nada mais é que adotar métodos e produtos visando retardar ou impedir o ataque de organismos xilófagos ou agentes biodeterioradores. Podemos dividir os agentes em quatro categorias: biológicos, físicos, químicos e físico-químicos. Entre os agentes biológicos os principais deterioradores são as bactérias, fungos, cupins e brocas marinhas. Entre os deterioradores físicos se encontra o calor e a umidade. Os químicos são soluções ácidas e básicas e os físico-químicos são a radiação, a poluição e também a combinação de ambos. Logo, a preservação é a adoção de técnicas, métodos e produtos visando retardar esses ataques e assim aumentar a vida útil da madeira.

5) Como se pode preservar madeiras? Quais as técnicas e processos mais usuais para tratar a madeira?

As técnicas podem ser divididas em “Com” e “Sem” pressão e os métodos podem ser divididos em curativos e preventivos. Os métodos curativos são aplicados quando o ataque já aconteceu e a intenção é a de recuperar a peça perdida. Os preventivos são utilizados quando ainda não teve o ataque, mas é possível prever que ele irá acontecer em algum momento do futuro. Depois de saber qual método é o recomendado, adota-se a técnica necessária, que pode ser com e sem pressão. A técnica sem pressão pode ser aplicada por aspersão, pincelamento, mergulho dentro de uma solução, ou então através de uma seringa. Os métodos com pressão, que também são conhecidos como métodos industriais, requerem a utilização de uma autoclave. Os produtos utilizados são divididos entre CCA e CCB. Os produtos à base de CCA são muito mais agressivos, seu manuseio deve ser seguido de normas, com uso de equipamentos de proteção individual e licenciamento ambiental, pois contém metais pesados e podem causar risco ao sol, a água e também ao ser humano. Contudo, quando aplicado dentro das regularidades, é considerado um produto seguro para o manuseio.

6) Por que tratar a madeira? Madeira tratada dura mais? Há alguma restrição para seu uso?

O risco de não tratar a madeira é refletido em um maior gasto de reposição de peças ao longo do tempo, pois gastará maior mão de obra para troca, mais fio de arame, mais peças tratadas. Quando a madeira é tratada, aumenta-se a vida útil do produto, porém não é possível prever quantos anos a peça tratada vai durar. A previsão varia muito em função de onde a peça será colocada, por exemplo, se uma madeira for tratada e colocada em condições de ambiente fechado, ela pode durar de 20 a 30 anos, mas se eu utilizar a mesma peça em um ambiente em contato com o solo, ela durará menos.

7) Tem algum comparativo entre a durabilidade da madeira tratada e a durabilidade da madeira não tratada?

Em geral a peça tratada dura de três a cinco vezes mais que a peça não tratada, temos como exemplo o moirão, que quando não é tratado dura aproximadamente de 2 a 3 anos enquanto uma peça com tratamento pode durar de 10 a 15 anos.

8) Entre os métodos por pressão e sem pressão, substituição de seiva e autoclave, existe alguma diferença na qualidade?

Primeiro vamos elucidar qual é a diferença entre um e outro. O método de substituição de seiva se baseia por dois princípios básicos, a capilaridade e difusão, que é quando a árvore é recém cortada e ela tem a translocação da seiva elaborada, principalmente pelos vasos. Imediatamente após o corte, como a seiva ainda está em translocação, se fizer o método de substituição de seiva, esta será substituída pela solução de sais preservantes. A diferença entre um e outro é a força de capilaridade, que não é uniforme em diferentes posições da árvore. O tratamento não é 100% eficaz porque possui manchas de maior e menor efeito de tratabilidade. Quando se usa o método industrial isso não ocorre, pois coloca-se a madeira já seca dentro da autoclave, com aproximadamente 30% de umidade, e se cria um vácuo inicial para retirar todo o ar que tem dentro das células, em seguida se despeja o líquido e abre a válvula onde o produto vai entrar na autoclave. Faz-se uma pressão de mais ou menos 12kgf/cm² por uma hora e meia, assim, o líquido vai entrar em todos os espaços vazios e, com isso, é possível conseguir uma maior homogeneidade e profundidade de tratamento. Logo após é realizado o vácuo final por 10 a 15 min., para retirar o excesso de solução e a peça é colocada para secagem à sombra. 

9) O tratamento caseiro é recomendado?

O tratamento caseiro é recomendado apenas para pequenas quantidades, ou seja, para pequenos produtores rurais. Para grandes quantidades é recomendado o método industrial.

10) O pequeno produtor tem que seguir alguma legislação para realizar o método da substituição?

Não, a substituição é considerada um método caseiro. O IEF entende que o método caseiro é para ser utilizado dentro da própria propriedade, porém os materiais usados, mesmo que menos tóxicos que os utilizados no método industrial, ainda são prejudicais para o meio ambiente. Existem formulações que são recomendadas em diversos manuais em que se faz a solução para ser usada em 100 litros de água e espera-se que tudo seja consumido durante o tratamento. Em casos que há sobra de material, a recomendação é deixar a solução ao sol e esperar evaporar a água, assim será obtido um caldo mais espesso ou então um pó. O agricultor pode retornar este material para uma Casa Agrícola ou então utilizar em obras de lajes, com a finalidade de isolamento acústico.  

11) Qual o impacto ambiental dos preservantes da madeira? Qual o impacto do manuseio e do descarte?

Para o método industrial é obrigatório o licenciamento, uma vez que a classe de periculosidade é grau 3, e isso exige licenças. Além disso, é considerada uma atividade de risco ambiental, tanto que para conseguir essas licenças o local onde vai ser instalado a autoclave tem que estar de acordo com as normas da engenharia civil, com alturas apropriadas de concreto, com um reservatório de emergência, chamado dry pad, caso vazamentos ocorram.

12) Como um jovem professor quais são as dicas e recomendações que você deixaria para os estudantes de pós-graduação em Ciência Florestal que almejam seguir a carreira acadêmica? E para os que pretendem encaram o mercado de trabalho fora da área acadêmica?

Hoje em dia o estudante sai da universidade com um nivelamento básico, pois ele sabe um pouco de tudo de todos os setores da Engenharia Florestal. Caso ele queira se destacar é preciso que faça além disso, ou seja, ser especialista porque generalista ele já é. Tem que se especializar em alguma área de atuação como em economia, tecnologia, silvicultura, manejo ou a parte de conservação, além de ser bom no que faz, é claro. Pensando no profissional da academia, que quer seguir mestrado é preciso pensar em inovação porque hoje em dia as agências de fomento estão em busca dos problemas mundiais, como mudanças climáticas, crise hídrica e como será o comportamento das florestas e das madeiras frente a este déficit que já está acontecendo.  Também a parte de tecnologia da madeira, novos usos da madeira, de nanotecnologia, métodos não destrutivos, principalmente de caracterização da árvore em pé. É essencial investir na parte de inovação tecnológica, pois as agências de fomento não querem trabalhos que fiquem na gaveta, querem ciência aplicada, nas empresas e em forma de extensão do ensino. 

 

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